terça-feira, 23 de agosto de 2016

Ponto Final

Quão difícil e doloroso deve ser um atleta, de qualquer esporte, saber que nunca mais participará da competição que mais gosta, não fará mais parte da festa que envolve cada evento esportivo, não ao menos como atleta. Confesso que me emocionei ao ver Gustavo Kuerten, em sua última participação em Roland Garros, ao ser eliminado, já tendo declarado que se aposentaria do circuito profissional de tênis, despedindo-se daquelas quadras que trouxeram tantas alegrias há um dos maiores tenistas brasileiros. Certamente ele sabia que estaria muitas vezes, como convidado da organização, participando do evento, mas não mais como atleta, dando seu máximo naquele saibro, independente do tamanho de sua chance de ser campeão. O quanto isso deve lhe ter entristecido, confundindo o seu ser, na reorganização de sua identidade. Outra cena que não sai da minha memória foi a despedida de Oscar Schmidt da seleção brasileira de basquete, nos jogos olímpicos de Atlanta de 1996. A camisa verde e amarela era praticamente a segunda pele dele, sendo considerado por muitos o melhor jogador brasileiro de basquete de todos os tempos. Ainda dentro de quadra, Oscar deu uma emocionante entrevista a uma emissora de televisão, descrevendo com muitas lágrimas o que sentia, o quanto difícil seria pra ele não estar mais presente no cenário que ele amava e fazer parte daquela festa. Esse tipo de dor acaba sendo bem dissipada pelos atletas de alta performance de corridas de rua. É muito comum vermos ex corredores de elite, participando de provas que o consagraram no auge, mesmo que apenas pra participar da prova, buscando saúde, qualidade de vida, ou entrar na máquina do tempo e sentir a sensação de levar seu corpo ao máximo do esforço físico, o vento batendo contra o rosto, travando uma batalha incessante contra o cronômetro e cruzar o pórtico de chegada, aquele mesmo que anos antes cruzara em primeiro lugar, mas agora em outra realidade, o objetivo torna-se fazer o seu máximo, sem se preocupar em qual posição possa ter chegado. Por várias vezes, vi o lendário José João, bi campeão da São Silvestre, muitos anos após seu período de conquistas, lutando consigo mesmo, brigando por segundos, para fazer um tempo muito mais alto que seu recorde pessoal, mas tão importante quanto, numa grande amostra de espírito esportivo, mostrando que fazer seu máximo faz parte de seu DNA, independente da posição que chega. Sem falar na brilhante corredora e admirável pessoa, Maria Zeferina Baldaia, que mesmo ainda estando em excelente preparo físico, ainda brigando por vitórias em corridas pelo Brasil, está distante do preparo físico do seu auge, que lhe renderam conquistas em provas tradicionalíssimas, botando seu nome na história do pedestrianismo brasileiro. Será que outros atletas, de outros esportes, permaneceriam ativos, mesmo não estando em seu ápice, não tendo condições de alcançar suas melhores marcas e feitos? E daqui uns 20 anos, será que Maria Zeferina ainda estará participando de São Silvestre, Maratona de São Paulo e afins, provas em que esteve no lugar mais alto do podium? Pessoas comuns terão a oportunidade de correr ao lado dela, e até chegar na frente. Isso proporciona um algo a mais para a corrida de rua. Bem que eu gostaria de jogar uma partida de tênis com Roger Federer, mesmo que não fosse um jogo oficial, numa simples partida amistosa. Está certo que isso seria mais difícil do que parece, pois nem ao menos sei jogar tênis, nunca sequer portei uma raquete. Não deixa de ser um sonho. Assim, podemos dizer que nós, corredores de rua amadores, somos privilegiados, por estarmos participando da mesma prova daqueles atletas que admiramos, mesmo que muito distantes durante a corrida, podendo até mesmo estar correndo ao lado de um multi campeão do passado, nos proporcionando muitas histórias pra contar.

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Arquitetos do esporte

Desenvolver um projeto de um prédio, do mais simples até o mais complexo e luxuoso, certamente é um difícil trabalho, exigindo um grau elevado de conhecimento, atenção e muita estratégia, afim de proporcionar o máximo de excelência no projeto, com total segurança, para que tudo funcione corretamente e acima de tudo, que "a casa não caia". Por esse e outros motivos, profissionais desse segmento são tão valorizados, cobrando caro por seus serviços, com suas agendas normalmente lotadas, profissionais que serão responsáveis pelo desenvolvimento do funcionamento de um grande bem em nossas vidas, que é a nossa casa. E treinar uma pessoa para uma corrida de rua, é tarefa mais fácil que essa? Desenvolver uma periodização equilibrada e eficiente, objetivando dar o máximo de condições para que seu aluno conclua, de forma saudável e dentro de suas expectativas, aquele sonho de correr uma maratona, seria algo de menor complexidade? Pode ser que se essas perguntas forem feitas para um engenheiro ou um arquiteto, as respostas sejam positivas, valorizando e elitizando suas ações profissionais, mas se a mesma for feita para aqueles que perdem horas e horas de seu dia, buscando saídas para aplicar os estímulos mais indicados, nos momentos certos, encaixando em rotinas profissionais insanas uma solução para uma preparação física ideal, a resposta com certeza será diferente. O treinador esportivo, por muitas vezes, passa de um simples educador físico para um estrategista, que buscará maneiras de estimular seus alunos, que diferentemente dos atletas profissionais, não possuem o tempo necessário para treino e principalmente para descanso. Por menor que seja as pretensões de um aluno, ele sempre tem em sua mente um objetivo pessoal, motivo esse que o fez procurar por um profissional capacitado, para lhe auxiliar chegar em seu sonho, com o máximo de saúde possível. Daí forma-se o desafio para o treinador, em criar uma periodização de treinamento, com o máximo de eficiência possível, analisando toda rotina de um atleta amador, que muitas vezes trabalha mais de 13 horas diárias, se alimenta inadequadamente, tem uma vida social agitadissima, quer uma evolução rápida, de preferência com premiações nas corridas e acima de tudo, com muita saúde. Essa situação já seria muito delicada em corridas consideradas curtas, normalmente nos 5 e 10 km, provas mais convencionais, que acontecem em quase todos os fins de semana, nas mais diversas cidades, por todo mundo. Agora, quando essa "sinuca de bico" encontra-se nas provas mais longas, entre maratonas e ultramaratonas, esse quebra cabeça fica interessante de se ver. Levando em consideração o aspecto já citado acima, que refere-se ao dia a dia do corredor amador, temos uma situação que inflama um pouco mais a missão do valente treinador, em montar o treinamento de seu aluno, o calendário de provas. Normalmente, o aluno destaca ao seu treinador uma prova alvo, seu objetivo principal a ser alcançado. Suponhamos que tal aluno fictício queira fazer uma ultramaratonas de 50 km, daqui a 4 meses, tempo suficiente para um atleta com uma certa experiência, que esteja já ativo. Tudo isso seria muito simples se esse mesmo aluno não tivesse aproximadamente de 6 a 8 provas superiores a uma maratona (42 km) nessas 16 semanas de treinamento para o desafio principal, de 50 km.É nessa hora que o treinador usa todo seu conhecimento e experiência, para tornar a rotina de treinos mais segura possível, usando todo seu repertório de treinos, buscando ritmos coerentes para estímulos adequados, tomando todo cuidado para seu atleta não se machucar e por fim em seu grande objetivo dos 50 km. Vale destacar que muitas maratonas e ultramaratonas, em sua grande maioria, são realizadas em belos lugares, pontos turísticos, que proporcionam ao atleta e sua família bons momentos de lazer e divertimento, unindo o útil ao agradável. Isso ameniza um pouco a pressão em cima do treinador, onde muitos corredores não se importam muito com suas performances e mesmo seus treinos são relativamente tranqüilos, não exigindo o máximo de seus corpos. Mas existem aqueles que alem de passear e se divertirem, vão dar seu máximo, em todas as provas que participarem, deixando bem divertida a tarefa do nosso genial treinador, pois fazer com que seu aluno chegue ao seu objetivo é sua tarefa, da forma mais saudável possível. Parabenizo esses arquitetos do esporte, pelo excelente trabalho que vem fazendo!