quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Brazil 135 Ultramarathon - Relato de Regina Gastaldo


A BR135 é uma ultramaratona (135 milhas, 215Km) que começa em São João da Boa Vista (SP) e termina em Paraisópolis (MG) quase divisa com São Paulo novamente. Este trajeto é parte do “Caminho da Fé” que termina em Aparecida do Norte, onde se encontra a enorme e famosa catedral.
Partimos na quinta-feira, dia 17 de janeiro. Eu, meus dois pacers (Agnaldo e Vanderley) além de meus cunhados (Paulo e Ana) que iriam ser minha equipe de apoio durante toda a prova. Participamos também de um almoço organizado pela prova, com a premiação do melhor ultramaratonista de 2012, que era o Agnaldo. Após tudo isso fomos para o hotel tentar descansar um pouco. Marcamos para às 19:00h um jantar com os componentes das duas outras equipes da Acrimet, que também iriam participar da prova, o Beto e o Dicler. A comida estava farta e deliciosa e todos nós comemos muito bem.
Tive uma noite bem dormida, acordando às 5:45h. Pontualmente às 6:00h estava tomando o café da manhã e até comi bastante. Voltei ao quarto para então me vestir e me encher de bloqueador solar pois o dia prometia ser bem quente. A largada era próxima do nosso hotel, então fomos caminhando até lá. Com todas as fotos tiradas, fiquei aguardando a largada com o Vanderley que iria começar a corrida comigo .Milagrosamente aquela ansiedade pré-prova quase não existia e lá fomos todos nós rumo a Águas da Prata, a primeira cidade 24Km adiante. Esta primeira etapa, boa parte se passava em um terreno difícil no meio de uma mata meio fechada e com alguma lama. Encontramos o único cadeirante da prova com bastante dificuldade em passar por este trecho. A partir daí comecei a ver que todo trajeto seria repleto de subidas e descidas intermináveis, lógico pois estávamos cruzando cidades localizadas na serra da Mantiqueira. A principio achei que iria só correr, bem devagar é claro, pois eram muitos kms a percorrer; mas fui percebendo que isso era impossível, dado o aclive e declive de alguns trechos, então acabei por aceitar ora andar ora correr. A paisagem de todo o percurso era lindíssima com direito até a um banho de cachoeira entre Aguas da Prata e Andradas. Comi até manga e banana colhidos pelo Vanderley na estrada. Começou a escurecer e o cansaço foi pegando e também o medo de cair, por não enxergar direito o caminho no escuro da noite, então decidi que a noite só andaria mesmo. Fizemos uma parada em uma pousada de apoio próxima de Barra, creio eu, aonde tomei um banho, comi um pouco de macarrão e descansei por um tempo,  para logo em seguida prosseguir noite adentro novamente. Lá pelas 2h da madrugada chegamos a uma cidade chamada Crisólia, todos dormindo, um silêncio só, quando avistamos duas mulheres em frente a uma casa que nos ofereceram um cafezinho quente. Se todos não tivessem tomado um gole, eu pensaria ter tido uma alucinação.
Lá pelas 6:00h da manhã, passamos por Ouro Fino, depois das fotos em frente da “Porteira com o Menino”, da célebre música, resolvi parar em uma pousadinha bem simpática. Tomei um belo banho, descansei na cama bem quentinha (coloquei 2 cobertores apesar do calor) por 1h. Levantei as 8:00h chamando todos em seus quartos para tomar café da manhã que estava uma delicia. Comi frutas, pão, queijo, leite com café, suco de laranja e um pão de queijo quentinho que só os mineiros sabem fazer.
Paramos novamente em Borda da Mata, aonde a Ana comprou um marmitex para o meu almoço. A partir deste ponto o trajeto foi ficando cada vez mais difícil e demorado para mim, até que em algum ponto entre Tocos do Moji e Estiva em uma descida bem acentuada eu não conseguia mais firmar minha perna direita no chão. Começou a escurecer novamente e nosso carro de apoio não estava por perto. Com a ajuda do Vanderley, improvisei um cajado para conseguir andar. Eu me sentia muito bem (Dr Décio a pressão estava ótima) mas, a musculatura das minhas pernas me avisaram que todas as subidas e descidas eram demais para elas. Encontramos o Mario no caminho e tiramos algumas fotos, logo após nosso carro de apoio e o Agnaldo me fez uma massagem com Biofenac, o que ajudou bastante. Resolvi então colocar as minhas botas de treking, pois as mesmas me dariam maior firmeza e segurança para caminhar do que o tênis de corrida. E lá fui eu novamente na companhia do cajado e do Vanderley a caminho de Estiva, cidade esta que nunca chegava. Depois de muito tempo encontramos dois moradores da região e perguntamos se a cidade estava longe e eles disseram: - Estiva, é logo ali. Esse logo ali nos valeu hora e meia de caminhada. Coisa de mineiro, né!!!  Pelas contas que fizemos pelo caminho, nós achávamos que faltavam uns 30Km para terminar a prova, mas quando, até que enfim, chegamos no posto de controle de Estiva, a moça que me atendeu disse: - Agora só falta uma maratona, 42Km.
Eu achava que ela estava brincando. Não estava. Era meia noite e pouco, teriam mais 8:00h para o término da prova e dai eu avaliei:
- Estou conseguindo andar somente me apoiando no cajado e no Vanderley (o que é proibido)
- Não vou conseguir chegar no prazo nem por milagre
- As minhas pernas já avisaram que era hora de parar
- O Luiz, meu marido, e a mana Maria, querem sair de SP para me esperar na chegada às 8:00h
- Todos trabalham na segunda feira
Bem, então só me restava parar. Só que o Agnaldo já estava lá pronto com as lanternas, para ir comigo neste último trecho e todos com cara de que eu deveria continuar. Só que no meu entender, correr é um ato de prazer com responsabilidade. Eu adoro correr. Esta corrida de 215Km em serra, foi muito para o que eu tinha treinado e eu tinha certeza absoluta que o melhor para mim seria parar naquele momento. E acho que quando a gente esta convicto no que faz os outros acabam aceitando e  foi o que aconteceu. É claro que todos ficaram tristes. Depois de meia hora decidimos voltar direto para SP, sujos, suados, cansados, meio tristes, mas felizes , especialmente Eu por ter corrido, andado, xingado, rido e me aventurado por caminhos tão lindos que a gente só percebe quando se corre de corpo e alma felizes.

Parte 2
Vale a pena lembrar da torcida dos que não foram, a mana Maria, o João, amigos e parentes. O Luiz, meu marido e amigo, que sempre me apoiou em minhas aventuras meio “diferentes”. Ao Luiz Filho que apesar de não falar das coisas que faço eu sinto o orgulho dele em falar o que faço para os outros. A Natália e o Helder, não preciso nem falar, porque algumas vezes já trilharam os mesmos caminhos que os meus.
Ainda dou risada ao lembrar dos “causos” do Vanderley que fizeram o tempo passar mais rápido. Da nossa amiga “cadelinha preta” que nos acompanhou desde Tocos do Moji até Estiva, ora choramingando quando se perdia de nós na escuridão da noite . De toda música ouvida por mim nos meus IPods gravadas pelo Helder, que em alguns momentos me lembravam do Aconcagua e me davam forças para correr novamente, quando já mal conseguia andar.
Dos encontros no trajeto com o Dicler, sempre com ânimo e alegria estampados em seu rosto, de quem tinha a certeza de que foi para completar, afora sua equipe, meus amigos, sempre com uma palavra de incentivo para mim. O esforço todo do Beto e sua turma para também completar a prova, depois de tantos contratempos.
Lembro do Agnaldo pegando um jornal velho e me fazendo uma caminha no chão da estrada para eu dormir. Desculpe, mas o chão era muito duro para meu corpo dolorido e a mantinha estava meio molhada. Era realmente uma situação hilária!!!
A Ana e o Paulo, sempre solícitos, cada vez que eu pensava em querer alguma coisa, lá estavam eles, fazendo, indo atras ou tirando toda a tralha do carro, porque o que eu queria, estava lá por último de tudo. No meu entender o pessoal de apoio é quem deveria ganhar um troféu.
Se volto para completar a prova? É claro, afinal fiquei sem conhecer a ultima perna do caminho
Mario, nos vemos no caminho!!!!!!
 Regina Gastaldo